In Cotidiano Saúde Mental

Um pequeno escombro


Os mortos escondem verdades que nós jamais ouviremos e muito menos saberemos a razão delas existirem. Carregam sobre si terra, flores, lágrimas e silêncio; talvez porque ninguém soube ouvir ou porque não sabiam como falar, afinal, pronunciar palavras de aflição nunca será fácil nem glorioso mesmo que hajam mil campanhas incentivando a libertação dos angustiados.

Estar vivo não é fácil para ninguém e precisamos reconhecer isto, precisamos nos igualar ao desespero do outro para que possamos abrir nossas mentes para o grito calado abafado pela covardia involuntaria de pedir ajuda. Todos os dias pessoas se matam sem deixarem motivos aparentes, sem deixar bilhetes, cartas ou testamentos. Todos os dias pulsos são cortados. Pescoços estão pendurados em cordas com os pés flutuantes enquanto você lê essa frase. Algumas pessoas choram sob o mesmo teto em que outras pessoas gargalham e ninguém as vê. A morte é sorrateira e sabe como seduzir quem ela quer ceifar, é sinuosa, quente, vadia, aparentemente gostosa com suas doces palavras de paz e alívio, porém, a morte é uma farsa!


Depois da Terra nada pode ser definido por nós. Tudo se torna mistério.

Pessoas suicidas elevam-se ao mistério vagarosamente passeando por cada etapa necessária. Questionamentos mil surgem sobre suas mentes nublando as boas idéias que tornam-se estáticas, uma verdadeira muralha. Quem quer morrer não avisa. O processo de tirar a vida é semelhante ao processo tirar a camisa suja no fim do dia: você só tira porque tudo nela lhe incomoda, mesmo que para os outros esteja visivelmente aceitável, para você é um incômodo sufocante.

Quem se mata não quer "chamar a sua atenção", quem se mata quer se auto reconhecer e chamar a si mesmo.

A vida e a morte são mistérios que jamais desvendaremos e tampouco conseguiremos mensurar, entretanto, há algo entre esses dois acontecimentos que podemos associar: tanto na vida quanto na morte existem sinais diários de existência. Quem quer morrer mostra que quer morrer. Atente-se aos detalhes. Olhe no olho. Leia muito bem as palavras do outro. Ouça com clareza o silêncio do excluído. Lute para que você seja um ser hipersensível que se incomoda com as distâncias repentinas, os silêncios subtos e as rebeldias. Nada combaterá a morte se ela já estiver instalada, nem filhos, nem mulher, nem homem, nem amigos, nem dinheiro, nem sucesso, nem saúde, nem amor, nada abaterá a morte se ela já estiver com um pé na ponta de uma cadeira pronta para se jogar na gravidade.

Esteja atento aos detalhes pois ninguém se mata no olho do furacão, a morte sempre se esconde debaixo de um pequeno escombro.

E, para você, que já pensou em se matar algum dia: não desista de ocupar o seu lugar no mundo, você é importante e a sua vida é uma peça encaixada no grande quebra-cabeça da vida. Grite os seus problemas, ouça a si mesmo, fuja do mistério da morte e da dubiedade dos sentimentos sombrios.

Procure ajuda especializada.
Seja ajuda.
Observe os detalhes.
Leia silêncios.


Por May Sousa 


O CVV – Centro de Valorização da Vida realiza apoio emocional e prevenção do suicídio, atendendo voluntária e gratuitamente todas as pessoas que querem e precisam conversar, sob total sigilo por telefone, email, chat e voip 24 horas todos os dias.

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