In Cotidiano Saúde Mental

Multiplicando o igual



Na última semana li um texto do filósofo sul-coreano Byung-Chul Han ( nome dificil esse), que me impactou. A análise de Han, traz uma reflexão sobre a mutiplicação do igual. Conclusão que deu nome à esta conversa que inicio aqui com vocês. No texto dele, a crítica é feroz sobre os praticantes de maratonas de séries, que ele se refere como o "binge watching" (hábito de ficar muito tempo ligado em algum entretenimento), e neste caso, só vendo que gostam, nunca o diferente ou alguém diferente. 

Byung-Chul Han/ Foto: Pinterest

A gente leva isso na bricandeira ou realmente comentamos e conversamos sobre horas e final de semana vendo séries mas será que isso realmente tem sido um hábito saudável para nós? Para Bryung-Chul Han esta é uma fuga do que é diferente, o que leva muitas pessoas a viverem no deserto ou no inferno do igual. 

Ele também aponta que antigamente, a sociedade tinha consicencia de que estava sendo dominada e hoje não temos essa consciencia. Refleti pesado nesta afirmação. É um fato! E estamos de mãos atadas! Várias vezes amigos, colegas de trabalho ou eu mesma digo a frase: "não tem internet, não dá para fazer nada" ou " tudo está conectado na internet, então, se não tem internet já era". Isso é um pouco assustador. Estamos dependentes tanto na vida quanto no trabalho. Acabei me dando conta que preferi estudar virtualmente do que no presencial pois facilita a vida.

 Mas e o prazer de conhecer pessoas e trocar ideias? Outro ponto que o filósofo cita é a autenticidade. Ele diz: “todos querem ser diferentes uns dos outros” mas o sistema só permite que existam “diferenças comercializáveis”. Ainda relutamos sobre o que é diferente. E isso é um exercício diário. O que era diferente para uma geração já não é diferente para esta geração do agora. E assim, caminhamos para novas diferenças. A barreira da ditadura social continua mesmo que você ou eu não colida com ela. 

E sobre a angústia de não estar fazendo tudo o que poderia ser feito”? Esta sede que temos sobre utilizar o tempo da melhor forma começou a nos boicotar? “Hoje a pessoa explora a si mesma achando que está se realizando; é a lógica traiçoeira do neoliberalismo que culmina na síndrome de burnout”. Esta síndrome tem se alastrado, e de acordo com a Organização Mundial de Saúde, "o burnout é produto de um mix de fatores pessoais, profissionais e sociais. Entre as causas individuais destacam-se o perfeccionismo, que leva à busca de uma excelência às vezes impossível, e o idealismo em relação à profissão, cobrando um engajamento pessoal para além dos limites". 



Não precisamos chegar nestes limites. Precisamos de calma. Paciência. É o momento de não nos alienarmos. E isso feito por nós mesmos. "A terra é mais do que digitos". Entendo a importância dos algoritimos para o que rege o mundo atualmente. Mas vocês já notaram que muitos especialistas e até mesmo os que trabalham com tecnologia estão com previsões assustadoras sobre o futuro e a internet? Neste caso, acabo vendo uma grande vantagem em nossa terra tucuju. 

As coisas demoram para chegar até aqui? Sim. Estamos numa ilha. Porém o privilégio de ainda poder tocar na terra, sentir a chuva, árvores, ver os pássaros nas ruas, isso tudo ainda nos deixa muito perto da sanidade. Vida e cores reais. Realidade. E não uma realidade virtual. A previsão de Han é um curto-circuito para recuperar nosso instinto animal original. “A aceleração atual diminui a capacidade de permanecer: precisamos de um tempo próprio que o sistema produtivo não nos deixa ter; necessitamos de um tempo livre, que significa ficar parado, sem nada produtivo a fazer, mas que não deve ser confundido com um tempo de recuperação para continuar trabalhando; o tempo trabalhado é tempo perdido, não é um tempo para nós”.

Não quero viver na Matrix. Que tal começarmos uma revolução com nosso próprio tempo? É um convite. Pela nossa saúde mental.


Ilustração: John Holcroft 


Por Camila K. Ferreira

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