In Cotidiano

Encontrar alguém é encontrar a si mesmo

Arte: Diela Maharanie

Encontrar pessoas é um privilégio perigoso, um risco que precisa ser corrido. Oportunidade singular de evoluir e enxergar aquilo que outrora esteve escondido dentro do nosso próprio eu.

Encontrar alguém que mergulhe em quem nós somos e que queira descobrir nossos detalhes mais profundos e íntimos é uma chance rara, saber aproveitar o que outra pessoa pode nos oferecer é um ato corajoso que exige cautela. Compartilhar vida é mais do que conhecer alguém; compartilhar vida é absorver o outro, fazer o encontro valer todo o esforço feito para que ele ocorresse. É achar na outra pessoa pontos de equilíbrio que ninguém [nem você mesmo] pode oferecer. É estar acolhido em qualquer palavra dada e/ou recebida. É ter certeza que existe um colo no mundo que pode abraçar as nossas derrotas e também as vitórias. Encontrar alguém é encontrar a si mesmo.

Mas, não podemos deixar de lado os contrapontos da arte do encontro. Estar disponível para alguém é dar espaço para que um corpo, outrora alheio, se junte ao seu, e, de alguma forma, vire um só. Encontrar é unir. A absorção dos hábitos, dos horários, dos gostos, do jeito, das preferências e tudo mais que existe na bagagem da outra pessoa são dores e delícias que nos propomos degustar mesmo sem nunca antes termos contato com nada disso. Precisamos ser maduros para entendermos que encontrar pessoas é estabelecer elos momentâneos ou duradouros que podem fazer diferença em toda nossa estrutura mental, emocional e até mesmo física. Doar-se a outro ser humano em qualquer espécie de relação amigável, erótica, financeira, espiritual, amorosa [ou tudo isso junto] e tantas outras possibilidades que possam existir, é, sobretudo, ceder e dar espaço na sua vida afim de beneficiar o outro. Encontrar é zelar. Admito que as relações humanas são bombas prestes a explodir, porém, também afirmo que o cuidado que dispensamos à essa bomba tentando fazer com que ela matenha-se em segurança afim de não causar nenhum dano, também faz parte do esquema.

Mentira, falsidade, tristeza, frustração, dor e tudo de mais amargo que os encontros podem oferecer, certamente serão esquecidos quando encontrarmos a pessoa certa. Veja bem: pessoa certa. E aqui chegamos em outro ponto relevante: encontrar pessoas nem sempre é eterno. Precisamos aprender a não romantizar tudo de forma que fiquemos presos em nossos próprios dogmas e fantasias acerca do amor perfeito, amizade perfeita, trabalho perfeito; precisamos entender que para tudo há um tempo estabelecido, tudo dura o tempo necessário. Às vezes dura muito. Às vezes dura pouco. Entretanto, precisamos aprender a dar valor para esses períodos e fazer do tempo o nosso infinito personalizado sem que o outro se sinta forçado a ficar só porque nós estamos sendo mimados e egoístas. Encontrar é permanecer voluntariamente. 

A cada dia que passa fica mais difícil encontrar pessoas que realmente estejam dispostas a compartilhar liberdade e usufruir dela com todo o ardor e tesão à que esta palavra nos remete. É muito difícil, mas, acredite, isso acontece. Os encontros são oportunidades ímpares que nunca mais se repetirão e jamais passarão por nós novamente com a qualidade da primeira vez. Encontrar é sentir de forma furiosa e avassaladora a liberdade de ser quem somos e mesmo assim sermos aceitos e desejados.

Arte: Francisco Torreblanca

A vida, como disse o poeta, é a arte do encontro, e neste exato momento enquanto lê este texto talvez você tenha pensado em alguém, um amigo, um amor,  ou um momento em que observou alguém de longe e sem nem conhecer aquela pessoa você sentiu ligado a ela... neste momento você teve um encontro com suas memórias afetivas [boas ou ruins] que te alertaram que os encontros são a fonte de manutenção da vida. Encontrar alguém é mudar vidas e ser mudado. É ser recíproco. É satisfação. É segurança. É zelo. É altruísmo. É descoberta. É liberdade. 

A vida é uma sala de espera pequena onde só cabem você e a pessoa que veio ao seu encontro; uma tela abstrata em que nada se pode definir, limitar ou impedir, apenas sentir a libertação que é se identificar com a imagem refletida nos olhos do outro.

 Encontre.


Por May Sousa 

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