In Cotidiano

Radical flexível


Certas vezes sou radical sobre coisas que não deveria e flexível quando eu deveria ser mais firme. E isso soa confuso, mas o lance é que não dá pra ser nem um nem outro de forma inquestionável. 

Apareceu uma postagem minha de 2016, e lá dizia que nós estávamos levando a vida muito a sério, e dando importância para coisas pequenas, fúteis e bobas. E enfim, um post até zen demais para mim. E lembrei que em algum momento da minha vida, queria ter mais esse momento zen, ter mais paciência... Mas, sinceramente? Parei com tudo isso. Parei de tentar forçar a barra comigo mesma, referente ao que tenho que "aturar", "relevar", "aceitar como se nada tivesse acontecido". Isso é uma escolha. E também não significa que fico carregando isso para todos os cantos ou, se carrego, é um problema que tenho a resolver. A questão é: não precisamos o tempo todo nos forçar a sermos bonzinhos, zen, equilibrados, passivos e qualquer coisa que remeta a "fique calado e aceite". Não, cara! Chega desse papo. Se você não gosta, não aceite. Se não se sente bem, fale. Se incomoda, reclame. Estou farta desse senso de falsa tolerância. O que é bem diferente de "aceitar calado". 

Acredito que a tolerância tem a ver com aceitar o que é diferente naturalmente. Agora, tolerar desvios de caráter, falta de educação, grosserias ou falsidades é completamente diferente. O pior é que somos induzidos, o tempo todo, a isso. "Relevar". Engraçado que relevar tem a ver com atenuar. Mas por que temos que atenuar ignorâncias? As amarras sociais vindas lá dos tempos medievais ainda pulsam forte e a gente tem mesmo é que ir quebrando cada correntinha pouco a pouco. 

Durante minhas férias comecei a assistir a novela "Em nome do Rei" e gostei. Gostei da trilha de abertura (Scarborough Fair' - Aurora) e até mesmo do roteiro, que parece clichê e óbvio, mas tem muito a ensinar sobre essa cultura do "aceitar" e "relevar" coisas ruins, por necessidade e conveniências. Não é de hoje que tenho um fascínio pelos filmes épicos (aliás, recomendo todos sobre a Rainha Elizabeth), e por eles é possível entender e perceber que continuamos replicando comportamentos e atitudes. 

Sei que é difícil ir contra essa correnteza forte que é a imposição social, e, por muitas vezes a seguimos pela necessidade. Só sei que é possível encontrar um esconderijo que você possa se proteger. E é ai que falo sobre a flexibilidade. 

Pensei durante muito tempo que ser flexível poderia me corromper ou me levar às águas deste rio cheio de obscuridade, mas não. Ir me conhecendo melhor foi o que me deixou mais confortável na minha própria pele e entender o que tenho que "relevar" e o que não tenho também ajudaram muito. E isso pode mudar. Ainda bem, que alívio. 

 "É preciso endurecer, mas sem perder a ternura jamais."

P.S: A conhecidíssima frase é atribuída ao revolucionário argentino Ernesto Che Guevara. Apesar de ser tão famosa quanto a fotografia "Guerrilheiro Heroico", de Alberto Korda, que já ilustrou milhares de camisetas, bonés e outras bugigangas, acredite, é bem difícil encontrar registro sobre a primeira vez em que essa sequência de palavras foi dita ou escrita. Depois de alguma pesquisa, descobri que ela consta no livro "Mi amigo el Ché"‎, de Ricardo Rojo, publicado por Jorge Alvarez, em 1968, quando Che já havia falecido. Fonte: Mercy, Zidane.


Camila K. Ferreira 

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